Sunday, February 21, 2010

Carácter...

Tenho o previlégio de morar junto ao Rio Douro e por isso venho, com certa regularidade até às suas margens para relaxar e “desligar” a ficha… passo horas a ver as gaivotas a mergulhar nos ares como que precipitadas repentinamente pela gravidade, sem controlo na queda… e recuperar o seu perfeito vôo a escassos centímetros da água… como se fosse fácil controlar uma queda daquelas… lembro-me e inspiro-me ao pensar no Fernão Capelo!
“Fernão Capelo gaivota”, “Jonhathan Livingston seagull”, foi um filme que mudou completamente a minha forma de olhar para cima e ver as gaivotas! Um dos raros casos em que, na minha opinião, o filme supera o livro! E o livro é excelente...!


Passo horas aqui, no meu carro, sentado a olhar para o nada… patos bravos… gaivotas… garças… pombas… palmeiras… encostas… pescadores… barquinhos de madeira… O RIO!Como disse, tenho o previlégio de morar junto ao rio e percorro muitas vezes a marginal para me deslocar para o trabalho, por isso, vejo, ouço, sinto e ligo-me ao seu carácter… à sua personalidade… comecei a escrever este artigo porque tive um insight… mais um dos vários que tenho quando simplesmente deixo de pensar e estou… simplesmente SOU!O rio douro, como todos os outros rios, é uma massa de água com milhares de quilómetros de extensão que parte de… um ponto de partida… e vai para… um ponto de chegada! Óbvio, certo? Tal como nós, que um dia nascemos e iniciamos a nossa jornada a que chamamos de Vida.

Nenhuma gotinha de água sabe, à nascente, qual é o seu destino, nem qual será a sua sorte… pode ser uma das gotinhas que irá regar um campo… pode ser uma das gotinhas que vai saciar a sede de algum animal, entre os quais, nós somos fortes candidatos… pode ser uma das gotinhas que vai esbarrar contra um pilar de betão de uma qualquer ponte e secar nas suas paredes… pode ser uma das gotinhas que chega ao mar e se mistura com outras gotinhas salgadas…O rio, esse, segue o seu percurso… há dias em que saio de casa e ele me acompanha castanho, cheio, forte, grosso, poderoso… nesses dias dá a sensação de estar “para poucas brincadeiras”… é o tipo de poder que vemos nas águas quando surgem calamidades entre nós! Nessas alturas percebemos a nossa dimensão no planeta e que “nada” somos na hora em que a Mãe Natureza resolve dizer “meninos, acabou a brincadeira! Vamos lá recomeçar tudo de novo!”.Há outros dias… em que o rio me recebe com o brilho mais incrivel! Parece que está a sorrir, a rir, orgulhoso, feliz, lindo, magnífico… tão calmo e tranquilo que se torna num belo espelho que ao pôr-do-Sol se veste de tons laranja e se transforma numa das mais belas paisagens que alguma vez vi!Hoje… ele está baço… transmite-me a sua sabedoria e serenidade… trás consigo pequenas ondulações que o tornam trémulo à primeira vista, mas que numa visão mais alargada se revela um cenário de movimento, acção, dinâmica… constante movimento. A mensagem é: “É precisa agitar as águas para criar mudança!

Tal como nós, também o rio tem a sua personalidade… o seu humor! Há dias em que acorda “bem disposto”, há outros dias em que acorda rabugento… mas pelo seu caminho rega campos, sustenta ecosistemas e contém Vida dentro de si! Independentemente de como acorda, o que o rio nos transmite a cada instante… é a calma e a sabedoria e a tranquilidade e a serenidade e a força e o poder e a energia de quem sabe o seu lugar e sabe o seu caminho e acima de tudo… sabe SEMPRE que vai!Como que indiferente às curvas, aos desvios, às pedras, às barreiras (barragens) que lhe aparecem no seu Caminho… sabendo que só o tempo lhe dará a força e revelará o seu carácter de seguir para onde quer seguir, deixando a sua marca de criação e renovação constante por onde passa. Se o rio Douro, por algum motivo, secasse amanhã… a marca do seu carácter ficaria e duraria séculos ou mesmo milénios! Mas o rio Douro precisou de outros tantos séculos para que essa marca ficasse…

Nós, por outro lado, temos “apenas” o nosso tempo… alguns ficam uns dias e partem… deixando a sua marca… outros estão por cá uns anos… outros ficamos por umas décadas… alguns, muito raros… passam por esta Vida e esta dimensão por mais de um século… a questão é: independentemente do tempo que cá passas… que marca estás a deixar na tua obra de arte a que chamamos VIDA? Que tipo de impacto estás a deixar e a criar nesta tua existência entre nós? Se a tua jornada terminasse amanhã… olharias agora para a tua Vida e dirias: “VALEU A PENA!”? É isso que cá fica depois de nós partirmos… tal como o leito seco do rio!

2 comments:

  1. Obrigado por mais um post tão motivador.

    Felizmente eu agradeço todos os dias pelo facto de estar vivo, e sim, orgulho-me do que estou a deixar por cá, está a valer a pena, e de que maneira.

    :)

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